sexta-feira, 21 de abril de 2017

O PORTEIRO ANALFABETO

   

          Não havia naquele povoado pior emprego do que 'porteiro de zona'.
          Mas que outra coisa poderia fazer aquele homem?
          O fato é que nunca tinha aprendido a ler nem escrever, não tinha nenhuma outra atividade ou ofício.
          Um dia, entrou como gerente do local um jovem cheio de idéias, criativo e empreendedor, que decidiu modernizar o estabelecimento.
          Fez mudanças e chamou os funcionários para as novas instruções.
          Ao porteiro disse:
          - A partir de hoje, o senhor, além de ficar na portaria, vai preparar um relatório semanal onde registrará a quantidade de pessoas que entram e seus comentários e reclamações sobre os serviços.
          - Eu adoraria fazer isso, senhor, balbuciou - Mas eu não sei ler nem escrever.
          - Ah! quanto eu sinto! Mas é assim, já não poderá seguir trabalhando aqui.
          - Mas senhor, não pode me despedir, eu trabalhei nisto a minha vida inteira, não sei fazer outra coisa.
          - Olhe, eu compreendo, mas não posso fazer nada pelo senhor. Vamos dar-lhe uma boa indenização e espero que encontre algo que fazer. Eu sinto muito e tenha sorte.
          Dito isso, deu meia volta e foi embora. O porteiro sentiu como se o mundo desmoronasse. Que fazer?
          Lembrou que no prostíbulo, quando quebrava alguma cadeira ou mesa, ele a arrumava, com cuidado e esmero.
         Pensou que esta poderia ser uma boa ocupação até encontrar um emprego.
          Mas só contava com alguns pregos enferrujados e um alicate mal conservado.
          Usaria o dinheiro da indenização para comprar uma caixa de ferramentas completa.
          Como o povoado não tinha casa de ferragens, deveria viajar dois dias em uma mula para ir ao povoado mais próximo para realizar a compra. E assim fez.
          No seu regresso, um vizinho bateu à sua porta:
          - Venho perguntar se você tem um martelo para me emprestar.
          - Sim, acabo de comprá-lo, mas eu preciso dele para trabalhar, já que...
          - Bom, mas eu devolverei amanhã bem cedo.
          - Se é assim, está bem. 
          Na manhã seguinte, como havia prometido, o vizinho bateu à porta e disse:
          - Olha, eu ainda preciso do martelo. Por que você não o vende para mm?
          - Não, eu preciso dele para trabalhar e além do mais, a casa de ferragens mais próxima esta a dois dias de viagem, de mula.
          - Façamos um trato - disse o vizinho.
          Eu pagarei os dias de ida e volta, mais o preço do martelo, já que você está sem trabalho no momento. Que lhe parece?
          Realmente, isto lhe daria trabalho remunerado por mais alguns dias.
          Voltou a montar na sua mula e viajou.
          No seu regresso, outro vizinho o esperava na porta de sua casa.
          - Olá vizinho, você vendeu um martelo a nosso amigo. Eu necessito de algumas ferramentas, estou disposto a pagar-lhe seus dias de viagem, mais um pequeno lucro para que você as compre para mim, pois não disponho de tempo para viajar e fazer compras. Que lhe parece?
          O ex-porteiro abriu sua caixa de ferramentas e seu vizinho escolheu um alicate, uma chave de fenda, um martelo e uma talhadeira. Pagou e foi embora. E nosso amigo guardou as palavtas que escutara: 'não disponho de tempo para viajar e fazer compras'.
          Se isto fosse certo, muita gente poderia necessitar que ele viajasse para trazer as ferramentas.
          Na viagem seguinte, arriscou um pouco mais de dinheiro, trazendo mais ferramentas do que havia as que já havia vendido.
          De fato, poderia economizar algum tempo em viagens.
          A notícia começou a se espalhar pelo povoado e muitos, querendo economizar a viagem, faziam encomendas.
          Agora, como vendedor de ferramentas, uma vez por semana viajava e trazia o que precisavam os seus clientes.
          Com o tempo, alugou um galpão para estocar as ferramentas e alguns meses depois, comprou uma vitrine e um balcão e transformou o galpão na primeira loja de ferramentas do povoado. Todos estavam contentes e compravam dele.
          Já não viajava, os fabricantes lhe enviavam os pedidos. Ele era um bom cliente. Com o tempo, as pessoas dos povoados vizinhos preferiam comprar na sua loja de ferragens, a ter de gastar dias de viagens.
          Um dia ele lembrou de um amigo seu que era torneiro e ferreiro. Pensou que este poderia fabricar as cabeças dos martelos.
          E logo, por que não, as chaves de fenda, os alicates, as talhadeiras, etc...
          E após foram os pregos e os parafusos.
          Em poucos anos, ele se transformou, com seu trabalho, em um rico e próspero fabricante de ferramentas.
          Um dia decidiu doar uma escola ao povoado.
          Nela, além de ler e escrever, as crianças aprenderiam um ofício.
          No dia da inauguração da escola, o prefeito lhe entregou as chaves da cidade, abraçou-o e disse:
          É com grande orgulho e gratidão que lhe pedimos que nos conceda a honra de colocar a sua assinatura na primeira página do livro das atas desta nova escola.
          - A honra seria minha, disse o homem. Seria a coisa que mais me daria prazer, assinar o livro, mas eu não sei ler nem escrever, sou analfabeto.
          - O senhor? - disse incrédulo o prefeito - O senhor construiu um império industrial sem saber ler nem escrever? Estou abismado. Eu pergunto:
          - O que seria do senhor então, se soubesse ler e escrever?
          - Isso eu posso responder, disse o homem com toda calma: - Se eu soubesse ler e escrever... ainda seria o porteiro do 'puteiro'.
          Essa história verídica se refere ao grande industrial chamado... Valentin Tramontina, fundador das Industrias Tramontina, hoje com muitas fábricas, milhares de empregados, produz milhões de unidades variadas por mês e exporta com marca própria para mais de uma centena de países - é a única empresa genuinamente brasileira nessa condição. A cidadezinha citada é Carlos Barbosa e fica no interior do Rio Grande do Sul.
          
          "Geralmente as mudanças são vistas como adversidades.
          As adversidades podem ser bênçãos.
          As crises estão cheias de oportunidades.
          Se alguém lhe bloquear a porta, não gaste energia com o confronto, procure as janelas.
          Lembre-se da sabedoria da água: 'A água nunca discute com seus obstáculos, mas os contorna'."

         

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